CASA DO BAILE

ANO: 1943

LOCAL: LAGOA DA PAMPULHA, BELO HORIZONTE, MINAS GERAIS

PAÍS: BR, BRASIL

DESCRIÇÃO:

Olhando para a Casa do Baile não é de todo fundamental referir o nome do autor, pois ele por si próprio emana o seu jeito de fazer arquitetura. A curva é algo que lhe é natural, mas é na forma como se integra e funde com a paisagem que afirmamos determinantemente a identidade do autor.

Implantada numa ilha artificial junto à também artificial lagoa da Pampulha em Belo horizonte (criada para o efeito) a casa foi ligada à avenida Otacílio Negrão de Lima por uma ponte de concreto de cerca de 11 metros. De facto, o concreto é um material muito presente não só neste projeto, mas em todo o conjunto de Pampulha.

«Material que exige critério e cuidados em sua adoção, seu estudo e sua execução, o concreto não permite modificações e correções na forma final e aspecto visual de sua superfície. Ser indestrutível e irreparável: perante esta característica, deveremos refletir sobre sua concepção, sua destinação e sua sobrevivência ao longo do tempo e sua consequente repercussão na história. (…) Além de ser matéria durável, de sua superfície se manter sempre viva e expressiva, a carga simbólica retirada das obras em concreto parece permitir à obra atravessar o tempo com mensagem sempre atual. — Álvaro Magalhães Drummond

A origem deste projeto tem nele associada uma tendência social de grande impacto por todo o mundo entre os anos de 1900 e 1945 denominada ‘Belle Époque’ ou ‘Anos Dourados’. Esta tendência é intimamente relacionada com uma cultura boêmia assente em padrões de ostentação e luxo. Oriunda da Europa, é marcada por construções com padrões fora do comum e jogos entre materiais pouco convencionais. No Brasil o impacto foi mais tardio devido à falta de instalações que albergassem atividades tão especificas como dança, jogo, casinos, entre outros.

Talvez seguindo os detalhes sublimes e requintados da época o projeto se afirme ele mesmo através de detalhes. A entrada é ligada por uma ‘passarela’ que nos leva a percorrer os jardins em plena comunicação com os elementos naturais predominantes: a água e a terra. Tomando um caminho sinuoso, grande parte deste percurso é acompanhado pelos azulejos monocromáticos de Paulo Werneck.

No momento de concepção da obra, Niemeyer apontava a particularidade do edifício constituir a intersecção de dois círculos que compõem o corpo principal, mas é nesta intersecção momento de entrada para o espaço interior que somos brindados com um jogo de vários materiais. Por um lado, o vidro que marca a marquise e por outro os azulejos que nos acompanham desde a entrada na ilha e ao longo dos jardins Burle Max.

A casa esteve aberta como salão de dança e restaurante por três anos, mas como consequência da proibição de jogos no Cassino entre 1946 e 2002 permaneceu suspensa de atividade. No entanto pelo engenho e interesse que despertava seguindo o traço de Niemeyer, em 2002 o projeto sofre algumas alterações pela mão dos arquitetos Mariza Machado Coelho e Álvaro Hardy.

As alterações são ténues e focam-se numa optimização do edifício nomeadamente nos sistemas de climatização e iluminação. Estas atualizações permitem então a reabertura na função atual de Centro de Referência de Arquitetura e Urbanismo. No antigo salão de baile é construído um auditório com capacidade para cinquenta e três pessoas.

Este foi o revitalizar de um edifício que passados cerca de sessenta anos se manteve atual e ponto de interesse para as mais variadas áreas de estudo. Na sequência da revitalização de 2002 surge em 2011 o projeto coarquitectura. O arquiteto Fernando Maculan à data ministrando a disciplina de Projeto no curso de Arquitetura e Urbanismo da UFMG lança o desafio de através de instalações temporárias produzir outro olhar sobre o projeto de Niemeyer.

O ensaio culmina em duas principais instalações, DERIVA e SOMA, dois olhares distintos sobre a mesma obra, mas que afirmam a complexidade patente no projeto original.

DERIVA, através de um jogo topográfico de cores, faz o observador percorrer o projeto de um outro modo possibilitando diferentes olhares e perspectivas do edifício. O peculiar da instalação é que esta foi acomodada num espaço de estar/paragem integrado nos jardins; somos por isso levados a olhar a paisagem pelo exterior através do projeto.

A intenção dos autores fixou-se na busca de uma nova realidade face à horizontalidade da arquitetura do autor assim como ‘uma extensão imagética’ –uma expressão dos próprios autores– dos jardins de Burle Marx.

Esta instalação leva-nos à imagem de que a calçada existente é elevada a várias cotas. Esta elevação é evidenciada pelo contraste entre as quatro cores que compõe a instalação –Vermelho, Amarelo, Verde e Roxo–. Através de uma estrutura delgada construída com recurso a um material metálico os módulos são manipulados individualmente criando uma peculiar relação cromática e topográfica no conjunto.

SOMA, de modo mais silencioso, apropria-se diretamente do edifício duplicando as formas em pontos peculiares do projeto. Esta apropriação é feita com um tom preto, cor que até à data estava apenas presente nos azulejos. Deste modo, o contraste e impacto desta intervenção parece evidenciar ainda mais estes detalhes de grande importância no projeto.

Segundo os autores, a instalação pretende evidenciar um conflito entre o uso e a preservação do património cultural, alertando-nos para o valor infindo da obra e a necessidade de combater a sua degradação.

A intervenção desenvolve-se desde o momento da entrada, acompanhando a sinuosa passarela que atravessa os jardins de Burle Max e culminando na marquise. Neste estágio final um novo jogo de luz marcado também pela inserção de uma câmara escura é acrescentado ao espaço interior.

Atualmente não está patente na Casa do Baile vestígios físicos da intervenção coarquitectura. Podemos, no entanto, entender que à semelhança de outras passagens, este constitui um importante olhar reflexivo que integra a história da obra.

Na presente função a Casa do Baile alberga exposições, mostras, seminários, encontros e outros eventos relacionados com as áreas de arquitetura, urbanismo e design. Até Abril de 2016 é possível visitar a exposição “Paisagens Arquitetônicas Contemporâneas: Normas Ortogonais e Sistemas Curvos”.

Márcia Nobre é arquiteta formada pela Escola de Arquitetura da Universidade do Minho, tendo no último ano de mestrado ingressado pelo programa Erasmus + na Hafencity Universität Hamburg. Apaixonada por viagens e pela descoberta de outras culturas, acredita que a maior fonte de conhecimento provém do diálogo e troca aberta de ideais entre pessoas.

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